quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Detalhes do Direito


Acerca do prazo de 5 dias , aparentemente afirmado pelo ME para aplicar o simplex da avaliação nas escolas, recebi dois mails com elementos informativos interessantes para contextualizar a situação e desapressar alguém mais assustadiço. O autor não pretende ser identificado, mas autorizou-me a transcrição da parte nuclear dos ditos mails:

1. Um decreto regulamentar tem de ser promulgado pelo Presidente. (O Presidente até pode ser sensibilizado para não o fazer com bons argumentos - insuficiente discussão com sindicatos, conflitualidade não resolvida e acima de tudo a tendência para o remendo legislativo e necessidade de coerência, isto é, "há uns tempos para o governo era de uma maneira e aprovei e agora já querem doutra?"). E este já é o segundo remendo. Que aprovasse o 1º sistema por cooperação estratégica até poderia fazer sentido. Agora coopera com os remendos com base em que teoria?

2. Mesmo que o PR aprove e promulgue a coisa ainda há prazos a considerar. No limite podem passar 40 a 45 dias. O PR tem 40 dias para promulgar o DR. Em média demora 20.O DR 11/2008 foi por exemplo aprovado pelo Governo a 24 de Abril, promulgado a 9 de Maio, referendado a 12 de Maio (pelo PM que é o notário privativo do PR e assim reconhece a assinatura) e publicado a 23 de Maio. Entrou em vigor a 24 de Maio. Isto é um mês depois.

3. Em Portugal só se podem cumprir DR publicados e em vigor (a net da DGRHE não chega e neste caso só prejudica os professores seguir esse caminho). Se alguém praticar actos antes do DR estar publicado devem ser impugnados (para começo administrativamente; ex: requerimento a contestar).

4. Assim para o DR ser cumprível, se se seguir a cadência do 11/2008, só daqui a um mês (15 de Janeiro) começam a contar os prazos que o SE refere.

5. Se o PR andar mais depressa está a dar sinal de favorecimento ao Governo. O silêncio já cansa mas esse sinal não devia ficar em silêncio e ser ruidosamente referido. Podia ser que acordasse.

Perante isto eu inquiri se, sendo um Decreto Regulamentar da responsabilidade do Governo, os trâmites são os mesmos.

Eis parte da resposta, que explica em termos técnicos aquilo que várias vezes tentei demonstrar em prosa de leigo na matéria:

Um Decreto regulamentar é do Governo (vide alínea 4 do art. 136 da Constituição).

Não vai à Assembleia da República até porque objectivamente nem é uma lei (é um regulamento).

Portugal é um país engraçado em termos de organização do poder legislativo:

Há leis (Leis da AR, DL do Governo e Decretos Legislativos Regionais). Que só são essas. Tudo o resto não é legislação (como às vezes se houve erradamente dizer nas escolas).

As Leis da AR podem ser sobre qualquer matéria mas há assuntos (Reserva absoluta e relativa de Lei) que só podem ser regulados em lei pela Assembleia ou que o Governo só pode legislar se for autorizado.

O Governo tem uma reserva de decreto-lei para a sua lei orgânica que só ele pode fazer. Pode fazer decretos lei sobre tudo salvo o que for de reserva do parlamento em que não pode legislar.

As leis sobre direitos fundamentais são por exemplo de reserva absoluta (porque os nossos constituintes, e tive a honra de trabalhar com um 5 anos, eram gente sensata e queriam limitar o poder legislativo do Governo a matérias que não afectassem as matérias essenciais).

Depois há regulamentos que são subordinados às leis.

Houve um teórico do Direito chamado Kelsen que explicou esta ideia da subordinação das normas muito bem com a ideia da pirâmide normativa:

No topo a Constituição
A seguir as Leis
Depois os regulamentos
Depois os actos paranormativos (vulgo despachos).

Kelsen foi um dos inspiradores das teorias do nosso actual direito público constitucional.

Acima da Constituição ainda falava dos princípios supra-normativos. Esse conceito foi o que permitiu julgar a malta de Nuremberga que se defendia dizendo que os seus actos eram legais face às leis alemãs. Foram todos condenados.

A ideia dos princípios supra-normativos que está acolhida na nossa constituição serviu para levantar o problema de um Direito acima das leis que impede violações de DH e penaliza crimes contra a humanidade.

Escrevo este arrazoado para lhe salientar uma ideia: a avaliação é um decreto regulamentar que está subordinada a uma lei (palpite lá, qual é a leizinha) e a princípios de outra (lei de bases que é uma lei de valor reforçado… sossegue que não vou arrazoar sobre isso….)

Adivinhou claro qual é a lei subordinante imediata:o ECD….

Daí que a luta da avaliação seja só um degrau até na abordagem jurídica da coisa.

Agora cada um que tire as suas conclusões, que eu já não gosto de encaminhar ninguém e já houve quem escrevesse num blogue corporativo que eu não sendo versado em leis, até posso ter razão.

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