Testemunhas confirmam pressões para procuradores arquivarem Freeport
Decisão final sobre inquérito a Lopes da Mota poderá ser na próxima semana
Os testemunhos de quem ouviu conversas mantidas entre Lopes da Mota, presidente da Eurojust, e os dois titulares do processo Freeport confirmam a existência de pressões. O relatório está a ser finalizado pelo inspector do Ministério Público, Vítor Santos Silva, e a decisão final sobre a abertura de procedimento disciplinar ou judicial cabe ao Conselho Superior do Ministério Público.
Mesmo que a maioria dos 19 conselheiros vote pelo arquivamento do caso, ficará registada a contundência de depoimentos que confirmam tentativas de condicionar Paes de Faria e Vítor Magalhães.
Se os argumentos jurídicos em torno da tese de prescrição do processo poderão ser interpretados como mera troca de opiniões entre "velhos amigos" - argumento utilizado por Lopes da Mota - mais difíceis de justificar são alusões a repercussões na carreira dos magistrados. Em encontros presenciais e conversas telefónicas, o presidente do Eurojust terá dito aos dois procuradores que iriam "tramar-se", ou "sofrer represálias" - depende das versões de testemunhos - se não acabassem depressa com a investigação. Foi-lhes transmitido que o primeiro-ministro queria celeridade no processo e sublinhado o risco de perda da maioria absoluta.
Algumas conversas foram testemunhadas pelo juiz Carlos Alexandre, pela responsável da PJ de Setúbal, Maria Alice Fernandes, e pela investigadora Carla Gomes. João Palma, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público que denunciou publicamente a existência de pressões, foi igualmente ouvido durante o inquérito.
Em sua defesa, o presidente da Eurojust (unidade europeia de cooperação judiciária) afirma ter sido mal interpretado e escuda-se na informalidade com que conversou sobre o caso, negando qualquer recado ou envolvimento de membros do governo. Mais contido do que em semanas anteriores, em que falou publicamente sobre o caso, ao i Lopes da Mota pediu silêncio: "Estando pendente inquérito, que é secreto, não posso nem devo prestar quaisquer declarações sobre o assunto".
Três cenários Processo disciplinar, processo-crime ou arquivamento são os desfechos possíveis do inquérito. O relatório do inspector tanto pode propor como deixar apenas conclusões para fundamentar a decisão final, que está nas mãos do Conselho Superior do Ministério Público. Dos 19 conselheiros, sete são de nomeação política (cinco pelo parlamento e dois pelo Ministério da Justiça) e os restantes são magistrados Ministério Público, encabeçados pelo procurador-geral da República, Pinto Monteiro.
Seja qual for o desfecho, Lopes da Mota já não se livra de uma queixa-crime em que são também visados José Sócrates e o ministro da Justiça, Alberto Costa. Na sequência das notícias vindas a público, apontando o ministro como fonte dos recados de Lopes da Mota, o Movimento para a Democracia Directa apresentou na Procuradoria-Geral uma queixa pelos crimes de coacção agravada, denegação da justiça, favorecimento pessoal, tráfico de influências, abuso de poder e prevaricação. "Está feita a participação e vamos aguardar serenamente", explica ao i o advogado José Maria Martins.
Não admira que no governo haja preocupação. Além de aumentar a exposição do ministro, está em jogo a presidência de um organismo europeu (ver texto ao lado). Lopes da Mota foi eleito para o cargo em Novembro de 2007.
Uma palavra a dizer tem igualmente o procurador-geral. Dele depende organicamente o magistrado e líder do Eurojust Lopes da Mota. É também sob proposta de Pinto Monteiro que o representante português no organismo europeu é nomeado ou exonerado.
Questionado sobre se poderá ter de pronunciar-se relativamente à continuidade de Lopes da Mota em Haia, Pinto Monteiro evitou, numa resposta escrita, a questão: "Não é possível neste momento retirar conclusões ou fazer previsões. Esclarece-se somente que o Procurador-Geral da República tem poder disciplinar sobre o magistrado".
Embora sem competência para interferir, o Presidente da República poderá ter uma palavra a dizer. Cavaco Silva recebeu há duas semanas João Palma, do Sindicato dos Magistrados, e antes esteve reunido com o Pocurador-Geral. Numa audiência de hora e meia, pediu a João Palma pormenores e tomou notas escritas sobre o caso das pressões.
Isenção A avaliação do Conselho Superior do Ministério Público terá como pano de fundo o alcance político, mas terá de lhe ser imune. "O conselho irá certamente acolher as conclusões que vierem a ser expressas no relatório. Será a única decisão sensata", diz um dos conselheiros. Sem querer antecipar cenários, outros conselheiros contactados afirmam desconhecer quando será feita a discussão do relatório.
Para terça-feira está agendado o plenário do conselho e uma sessão disciplinar, mas não há garantias de que nessa data o relatório já tenha sido entregue. "Neste momento é só possível esclarecer que se aguarda que o inspector nomeado, Santos Silva, faça a entrega do respectivo relatório na próxima semana", esclarece, numa nota escrita, a Procuradoria-Geral da República. "No primeiro Conselho Superior que tiver lugar após a entrega, a questão será discutida."
No domingo, à margem da cerimónia do terceiro aniversário da GNR, Pinto Monteiro tinha prometido conclusões ainda para "esta semana". Convicção frustrada devido a entendimentos distintos sobre a fórmula de contagem dos 30 dias do prazo para a investigação.
Inicialmente, a PGR tinha considerado que o prazo terminava um mês depois da nomeação, a 7 de Abril. Mas Santos Silva entendeu que "à contagem do prazo se aplica o Código de Procedimento Administrativo, pelo que não se tem em conta os sábados e os domingos". Ou seja, o prazo legal prolonga-se até dia 18.
Reservado e distanciado da comunicação social, Vítor Santos Silva prepara o relatório sem comentários para o exterior. Descrito pelos colegas como "eticamente irrepreensível" e "imune a tentativas de influência", Santos Silva é inspector desde 1990 e está graduado para o Supremo Tribunal de Justiça. Fez toda a sua carreira em Coimbra, longe do Terreiro do Paço. Porque a sua jubilação está próxima, este poderá ser o seu último trabalho. Balança de signo, estará a pesar cuidadosamente as duas medidas em confronto no inquérito.
daqui
Decisão final sobre inquérito a Lopes da Mota poderá ser na próxima semana
Os testemunhos de quem ouviu conversas mantidas entre Lopes da Mota, presidente da Eurojust, e os dois titulares do processo Freeport confirmam a existência de pressões. O relatório está a ser finalizado pelo inspector do Ministério Público, Vítor Santos Silva, e a decisão final sobre a abertura de procedimento disciplinar ou judicial cabe ao Conselho Superior do Ministério Público.
Mesmo que a maioria dos 19 conselheiros vote pelo arquivamento do caso, ficará registada a contundência de depoimentos que confirmam tentativas de condicionar Paes de Faria e Vítor Magalhães.
Se os argumentos jurídicos em torno da tese de prescrição do processo poderão ser interpretados como mera troca de opiniões entre "velhos amigos" - argumento utilizado por Lopes da Mota - mais difíceis de justificar são alusões a repercussões na carreira dos magistrados. Em encontros presenciais e conversas telefónicas, o presidente do Eurojust terá dito aos dois procuradores que iriam "tramar-se", ou "sofrer represálias" - depende das versões de testemunhos - se não acabassem depressa com a investigação. Foi-lhes transmitido que o primeiro-ministro queria celeridade no processo e sublinhado o risco de perda da maioria absoluta.
Algumas conversas foram testemunhadas pelo juiz Carlos Alexandre, pela responsável da PJ de Setúbal, Maria Alice Fernandes, e pela investigadora Carla Gomes. João Palma, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público que denunciou publicamente a existência de pressões, foi igualmente ouvido durante o inquérito.
Em sua defesa, o presidente da Eurojust (unidade europeia de cooperação judiciária) afirma ter sido mal interpretado e escuda-se na informalidade com que conversou sobre o caso, negando qualquer recado ou envolvimento de membros do governo. Mais contido do que em semanas anteriores, em que falou publicamente sobre o caso, ao i Lopes da Mota pediu silêncio: "Estando pendente inquérito, que é secreto, não posso nem devo prestar quaisquer declarações sobre o assunto".
Três cenários Processo disciplinar, processo-crime ou arquivamento são os desfechos possíveis do inquérito. O relatório do inspector tanto pode propor como deixar apenas conclusões para fundamentar a decisão final, que está nas mãos do Conselho Superior do Ministério Público. Dos 19 conselheiros, sete são de nomeação política (cinco pelo parlamento e dois pelo Ministério da Justiça) e os restantes são magistrados Ministério Público, encabeçados pelo procurador-geral da República, Pinto Monteiro.
Seja qual for o desfecho, Lopes da Mota já não se livra de uma queixa-crime em que são também visados José Sócrates e o ministro da Justiça, Alberto Costa. Na sequência das notícias vindas a público, apontando o ministro como fonte dos recados de Lopes da Mota, o Movimento para a Democracia Directa apresentou na Procuradoria-Geral uma queixa pelos crimes de coacção agravada, denegação da justiça, favorecimento pessoal, tráfico de influências, abuso de poder e prevaricação. "Está feita a participação e vamos aguardar serenamente", explica ao i o advogado José Maria Martins.
Não admira que no governo haja preocupação. Além de aumentar a exposição do ministro, está em jogo a presidência de um organismo europeu (ver texto ao lado). Lopes da Mota foi eleito para o cargo em Novembro de 2007.
Uma palavra a dizer tem igualmente o procurador-geral. Dele depende organicamente o magistrado e líder do Eurojust Lopes da Mota. É também sob proposta de Pinto Monteiro que o representante português no organismo europeu é nomeado ou exonerado.
Questionado sobre se poderá ter de pronunciar-se relativamente à continuidade de Lopes da Mota em Haia, Pinto Monteiro evitou, numa resposta escrita, a questão: "Não é possível neste momento retirar conclusões ou fazer previsões. Esclarece-se somente que o Procurador-Geral da República tem poder disciplinar sobre o magistrado".
Embora sem competência para interferir, o Presidente da República poderá ter uma palavra a dizer. Cavaco Silva recebeu há duas semanas João Palma, do Sindicato dos Magistrados, e antes esteve reunido com o Pocurador-Geral. Numa audiência de hora e meia, pediu a João Palma pormenores e tomou notas escritas sobre o caso das pressões.
Isenção A avaliação do Conselho Superior do Ministério Público terá como pano de fundo o alcance político, mas terá de lhe ser imune. "O conselho irá certamente acolher as conclusões que vierem a ser expressas no relatório. Será a única decisão sensata", diz um dos conselheiros. Sem querer antecipar cenários, outros conselheiros contactados afirmam desconhecer quando será feita a discussão do relatório.
Para terça-feira está agendado o plenário do conselho e uma sessão disciplinar, mas não há garantias de que nessa data o relatório já tenha sido entregue. "Neste momento é só possível esclarecer que se aguarda que o inspector nomeado, Santos Silva, faça a entrega do respectivo relatório na próxima semana", esclarece, numa nota escrita, a Procuradoria-Geral da República. "No primeiro Conselho Superior que tiver lugar após a entrega, a questão será discutida."
No domingo, à margem da cerimónia do terceiro aniversário da GNR, Pinto Monteiro tinha prometido conclusões ainda para "esta semana". Convicção frustrada devido a entendimentos distintos sobre a fórmula de contagem dos 30 dias do prazo para a investigação.
Inicialmente, a PGR tinha considerado que o prazo terminava um mês depois da nomeação, a 7 de Abril. Mas Santos Silva entendeu que "à contagem do prazo se aplica o Código de Procedimento Administrativo, pelo que não se tem em conta os sábados e os domingos". Ou seja, o prazo legal prolonga-se até dia 18.
Reservado e distanciado da comunicação social, Vítor Santos Silva prepara o relatório sem comentários para o exterior. Descrito pelos colegas como "eticamente irrepreensível" e "imune a tentativas de influência", Santos Silva é inspector desde 1990 e está graduado para o Supremo Tribunal de Justiça. Fez toda a sua carreira em Coimbra, longe do Terreiro do Paço. Porque a sua jubilação está próxima, este poderá ser o seu último trabalho. Balança de signo, estará a pesar cuidadosamente as duas medidas em confronto no inquérito.
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