sábado, 14 de junho de 2008

Dia Mundial da Criança, uma aventura

No passado domingo, dia 1 de Junho de 2008, passeei com a minha filha no jardim da cidade, e cruzei-me com vários pais e mães que acompanhavam também os seus filhos. Na expectativa de que poderíamos encontrar um simpático palhaço a distribuir balões ou qualquer coisa do género, mais ou menos simbólica mas, qualquer coisa… Não havia nada de especial para as crianças nesse dia.
Vi sim, um indivíduo do sexo feminino com pinta de agarradíssimo, adquirir a 5 metros de mim, o material necessário para fugir à realidade. O tal polícia que me multou a propósito de uma matrícula desadequada, não estava lá. . . nem os seus colegas e chefes imaginam, coitados, quem são os ‘dealers’ da minha terra.
Se tivesse andado mais uns quilómetros, teria encontrado motivo de diversão.
Numa altura em que a maior parte daqueles com que nos cruzamos na vida ou na rua
exibem claros e evidentes sinais de tristeza, preocupação, revolta e desencantamento;
Numa altura em que reconhecidamente os nossos governantes afirmam não ter capacidade de resolver os principais problemas que afligem o comum dos mortais (taxas de juros a trepar tal como o preço dos combustíveis e de tudo o que é transportado, para não falar da saúde, justiça, educação, arte e cultura,...) ;
Iria encontrar o responsável pela pasta da Agricultura, do Desenvolvimento Rural, das Florestas e das Pescas, algures numa Zona de Caça do barrocal algarvio, a apanhar lixo, daquele selvaticamente lançado por cidadãos de má estirpe.
A alguns quilómetros mais para sul, pescadores zangados, faziam greve às saídas para o mar. O combustível que o senhor Ministro não paga para vir ao Algarve ajudar ao protagonismo dos caçadores e dos seus dirigentes, é caro demais para o vulgar dos mortais.
O senhor Ministro acha mais escandaloso o protesto dos pescadores, do que o comportamento do seu dirigente máximo da ASAE ao fumar num casino ou a desmentir as indesmentíveis metas e objectivos definidos para os respectivos inspectores.
O senhor Ministro não fala com os desgraçados do seu Ministério que enviou para o “quadro de disponíveis”, baixando-lhe implacavelmente os seus parcos rendimentos mensais, nem fala com qualquer um que entenda ter razões de queixa da sua política agrícola (será que tem alguma política?).
O senhor Ministro entende que cumprimentar os caçadores algarvios, numa acção de limpeza de lixo, é o que de mais importante há a fazer no Dia da Criança.
As campanhas de limpeza do espaço rural, desenvolvidas pela Federação de Caçadores do Algarve, carismaticamente liderada pelo senhor Vítor Bota Palmilha (tanto quanto se julga saber pela chamada vox populi, também ele um disponível do Ministério da Agricultura), são dignas de registo e da aprovação geral. Contribuem para mudar a imagem nem sempre positiva que os caçadores têm na opinião pública. Tiro o chapéu à organização da apanha do lixo, que conseguiu trazer um alto dirigente do Estado português junto do povo, numa acção da mais alta relevância para a sociedade e que o ambiente agradece.
Os caçadores no Algarve, todos eles (julgo eu) por razões lúdicas, são uma minoria que rondará os 18 000. Provavelmente os pescadores não serão em maior número, mas tenho certo de que contribuem muito mais positivamente para a economia regional e nacional que aqueles. Ainda assim, quase que aposto que, da próxima vez que o senhor Ministro vier ao Algarve, será concerteza para confraternizar novamente com os caçadores durante a tradicional Feira da Caça (mais ou menos e como habitualmente, daqui por um mês), e não para qualquer uma reunião de trabalho com os pescadores ou agricultores.
O Estado tem apoiado a Federação de Caçadores e os dirigentes de ambos os lados encontram-se com a assiduidade que muito bem entendem. Mas não me digam que ninguém tem nada a ver com isso. Temos sim, temos o direito de, pelo menos questionar o que vão fazendo com o dinheiro dos nossos impostos. E eu, pelo menos, não acolho com agrado a ideia de o senhor ministro se transportar numa viatura que não é a sua viatura pessoal, com combustível do orçamento do Estado, ao invés de ser do seu próprio pessoal, para participar numa acção de propaganda de uma Federação de Caçadores, por muito interessante e folclórica que seja essa iniciativa.

Será que o senhor Presidente da Federação de Caçadores do Algarve exerce um magistério de influências suficiente para mobilizar tantos dirigentes do Estado numa jornada de limpeza? Ou será que o senhor Ministro, encontrando-se mal visto no mar pelos pescadores, procurou em terra o apoio dos caçadores? Será a lei das compensações? Uma espécie de Yin-Yang da política agrícola comum para a protecção dos stocks das espécies marinhas, versus exploração sustentada dos recursos cinegéticos?

E já agora . . . : o nemátodo do Pinheiro será Yin? O declínio do Sobreiro será Yang? A caça será agora branca porque a pesca está preta? E como tudo está em ciclo, será que daqui por uns tempos não será o contrário?

Será que qualquer dia veremos o sr. Ministro a vestir um fato de mergulhador para apanhar lixo do fundo do mar? Será programa para o próximo Dia da Criança? Se for, contará com a minha simpatia, desde que, claro, não gaste com isso, um velho tostão do erário público.



José Filipe

Sem comentários: