Geração à rasca foi a minha. Foi uma geração que viveu num país vazio de gente por causa da emigração e da guerra colonial, onde era proibido ser diferente ou pensar que todos deveriam ter acesso à saúde, ao ensino e à segurança social.
Uma Geração de opiniões censuradas a lápis azul. De mulheres com poucos direitos, mas de homens cheios deles. De grávidas sem assistência e de crianças analfabetas. A mortalidade infantil era de 44,9%. Hoje é de 3,6%.
Que viveu numa terra em que o casamento era para toda a vida, o divórcio proibido, as uniões de facto eram pecado e filhos sem casar uma desonra. Hoje, o conceito de família mudou. Há casados, recasados, em união de facto, casais homossexuais, monoparentais, sem filhos por opção, mães solteiras porque sim, pais biológicos, etc.
A mulher era, perante a lei, inferior. A sociedade subjugava-a ao marido, o chefe de família, que tinha o direito de não autorizar a sua saída do país e que podia, sem permissão, ler-lhe a correspondência.
Os televisores daquele tempo eram a preto e branco, uns autênticos caixotes, em que se colocava um filtro colorido, no sentido de obter melhores imagens, mas apenas se conseguia transformar os locutores em "Zombies" desfocados. Hoje, existem plasmas, LCD ou Tv com LEDs, que custam uma pipa de massa. Na rádio ouviam-se apenas 3 estações, a oficial Emissora Nacional, a católica Rádio Renascença e o inovador Rádio Clube Português. Não tínhamos os Gato Fedorento, só ouvíamos Os Parodiantes de Lisboa, os humoristas da época. Havia serões para trabalhadores todos os sábados, na Emissora Nacional, agora há o Toni Carreira e o filho que enchem pavilhões quase todos os meses. A Lady Gaga vem cantar a Portugal e o Pavilhão Atlântico fica a abarrotar. Os U2, deram um concerto em Coimbra em 2010, e UM ANO antes os bilhetes esgotaram.
As Docas eram para estivadores, e o Cais do Sodré para marujos. Hoje são para o JET 7, que consome diariamente grandes quantidades de bebidas, e não só... O Bairro Alto, era para a malta ir às meninas, e para os boémios. Éramos a geração das tascas, do vinho tinto, das casas do fado e das boites de fama duvidosa. Discotecas eram lojas que vendiam discos, como a Valentim de Carvalho, a Vadeca ou a Sasseti.
As Redes Sociais chamavam-se Aerogramas, cartas que na nossa juventude enviávamos lá da guerra aos pais, noivas, namoradas, madrinhas de guerra, ou amigos que estavam por cá. Agora vivem na Internet, da socialização do Facebook, de SMS e E-Mails cheios de "k" e vazios de conteúdo.
As viagens Low-Cost na nossa Geração eram feitas em Fiat 600, ou então nas viagens para as antigas colónias para combater o "inimigo".
Quem não se lembra dos celebres Niassa, do Timor, do Quanza, do Índia entre outros, tenebrosos navios em que, quando embarcávamos, só tínhamos uma certeza... ...a viagem de ida.
Quer a viagem fosse para Angola, Moçambique ou Guiné, esses eram os nossos cruzeiros.
Ginásios? Só nas coletividades. Os SPAS chamavam-se Termas e só serviam doentes. Coca-Cola e Pepsi, eram proibidas, o "Botas", como era conhecido o Salazar, não nos deixava beber esses líquidos. Bebíamos, laranjada, gasosa e pirolito.
Recordo que na minha geração o País, tal como as fotografias, era a preto e branco. A minha geração sim, viveu à rasca. Quantas vezes o meu almoço era uma peça de fruta (quando havia), e a sopa que davam na escola. E, ao jantar, uma lata de conserva com umas batatas cozidas, dava para 5 pessoas. Na escola, quando terminei o 7ºano do Liceu, recebi um beijo dos meus pais, o que me agradou imenso, pois não tinham mais nada para me dar. Hoje vão comemorar os fins dos cursos, para fora do país, em grupos organizados, para comemorar, tudo pago pelos paizinhos.. Têm brutos carros, Ipad's, Iphones,PC's, …. E tudo em quantidade. Pago pela geração que hoje tem a culpa de tudo!!!
Tiram cursos só para ter diploma. Só querem trabalhar começando por cima. Agora IMAGINEM, o que teriam para contar e escrever sobre a sua geração, se o soubessem fazer os analfabetos, nascidos na década de 30 e 40 do século passado, que viveu os despojos da 2ª. guerra mundial e todos os seus efeitos posteriores, desde o RACIONAMENTO, com o uso de SENHAS, que condicionavam os bens mais comezinhos, como o acesso ao carvão, às bolas de carvão, ao petróleo para uso nos fogareiros, limitava o nº. pães/carcaças às famílias, não havia azeite, açúcar bem como a maioria dos bens alimentares, as famílias completas com 4 e 5 filhos, viviam em buracos telúricos, barracas, quartos ou partes de casa alugadas, as pessoas andavam descalças, rotas mas sem ser por moda, passavam verdadeira fome, empenhavam tudo o que havia em casa à 4ª.Feira, para depois levantar da casa de penhores, se pudessem, ao sábado, dia de receber o reles salário, num ciclo vicioso. Os atrás citados, são a geração dos atuais avós ou bisavós, que ainda vivos continuam a não contar aos descendentes por vergonha do seu passado e depois na ânsia de darem uma vida melhor aos seus filhos e netos os estragaram com mimos e benesses e contribuíram inconscientemente, para que eles enveredassem desmesuradamente pelo consumismo de toda a ordem, criando uma dívida descomunal sem procedentes na história do país. Esta é que é uma verdade insofismável que poucos tem a coragem de contar.Na minha geração, dos jovens só se esperava que fossem para a tropa ou emigrassem. Na minha Geração o País, tal como as fotografias, era a preto e branco.
Afinal qual é a geração à rasca?
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